MAIS POEMAS de Rodrigo de Souza Leão  

bruno

                                                                                                                                          rodrigo

 

não tendo nada a dizer, disse

 


 

desgrenha tua mão de mil folhas

caídas no chão o farfalho

o orvalho natural das correntes

de vento circular – tufão de solo

 

de olhar tão cedo a manhã, o dia

surge naturalmente tal bruma

e esconde cada qual, cada uma

das riquezas cilhadas do czar

 

beijei-lhe a boca nove vezes

furacão de luz flechou olhos

se não estivesse aromatizado

teria-lhe dito: eu te amei

 

mas como de brisa, alimento

rumino o silêncio dos dias

estou há cem anos sem falar

de pasárgada ou de maricá

 

por isso: vivo em silêncio

escrevo o que não sei dizer

e principalmente quem

no bem me quer me escolher

 

trituro as manhãs como hoje

centrifugando o que digo

tornando-me menos amor

e da natureza um bom amigo



 

bacana

 

 

atuar, atingir, flechar

a cupidácea fêmea

 

para que ao encontro

a tênue exatidão do ser

 

esteja no emaranhado

de nossos corpos

 

trocados... torpedos

de papel e anzóis

 

azuis: olho em nós

tantos cuspidos

 

perdigotos, cupidos

e nós três na troca

 

agora à trois. a menage

a baco homenagem



 

para navegar em silêncio

 

 

cardumes de silêncio

navegam linearmente

entre as minas d’água

 

lá iam nossos peixes

quando um toque

provocou a explosão

 

você me falou morte

perdida em detalhes

feito explodir: gritou

 

gritar, não dizer nada

melhor se dar a outra

de outra forma minada



 

penelope

 

 

trançando o futuro de tranças

penelope faz destruindo

o presente com suas mantas

o tempo passa ruindo

 

e de não ver e não ser

austera e ímpia em sua dor

a cada laço um desfazer

no futuro de tudo o amor



 

primeira masturbação

 

 

esquinas de horizonte deflagravam

os olhos biônicos da aurora

- sedutora mendiga andrajada de estrelas

 

e foi passando pelas ruas de aurora

que contornei todo violão de sua forma

toda a guitarra de sua voz

 

então busquei o amor de olhos faroleiros

e ao invés de me iluminar, se iluminaram

e eu me perdi enquanto apagava o mar

 

eu ia naufragando em sua saliva salgada

foi quando respirei as vogais de sexo

e ereto olhei pro teto que gozava em mim



 

chover

 

 

teu caminho natural à noite

(errata circunstancial tarde)

veneno fruídor de horizontes

 

percorre o teu caminho amigo

de flor que se desabita do doar

de flor desabitada de cheiro

 

deforma a nuvem que te escolhe

e fede a cada segundo uma vez

como o natural verdugo da terra



 

rosa

 

 

combinar na alquimia

a exótica fragrância

do ser que se vicia

o amor, a sua ânsia

 

e deixar pólen furtivo

naquela flor amorosa

pr’eu beija-flor altivo

pingar-te, minha rosa



plástica

 

 

 

tirando vértebra

batiza etérea

impulsão de vida

península pura

 

escuta negros

vértices temas

criado problema

amputa-te toda  


couve e feijão

  

o leme e a poupa

o mar e os sargaços

 

o garfo e a faca

a boca e a comida

 

quem semeia

quem acusa o vento

 

quem baba

quem come migalhas

 

sargaços de comida

sobre o prato de feijão



 

torre eifel

  

com um fio de céu

teci o teu infinito

 

de grito em grito

descobri a rapsódia

 

de telha em telha

fiz a minha babel

 

de grilo em grilo

iluminei torre eifel

 


a parteira

 

em seu oculto olhar

atrás dos óculos rayban

estará o lúgubre de orelhas

a fauna habitual de um olho

e a natureza de um ser humano

 

em seu oculto olhar

há uma mulher  que ama

há um homem que desaba

e um triste sonho de viver

com alguém que não te ama

 

em seu oculto olhar

há um oculto arco-íris

e um velho aeroilis de vovô

e a remington de everaldo

e muitos sonhos de que serei

 

em seu oculto olhar

há uma louca conjuntivite

e uma barriga de filho vindo

e uma bacia de água

e muitos sonhos em que sou

 


bazuca

 

 

o presente me olha angulado

engulo o silêncio, desembrulho

me embrulhando para você

que me deu este lindo presente

 

então me entrego em sua porta

assim como foi entregue o meu

ó, seu presente é mais magro

- bazuca de canhão e míssil



  

as águas de uma lagoa

 

levantar e abaixar

servir e se revoltar

 

estar no barco

e puxar o mar pra perto

 

pro nosso deserto

ouvir o lago rangendo

 

pedindo água

nas anáguas das ondas

 

as espumas das ondas

as espumas azuis

 

são detergentes 

da natureza: o pus

 

levantar e abaixar

catar e se revoltar



 

canastrão

 

mambembo por aí

represento-me e a outros

me camuflo(r) de devir

 

mambembo em ti

não te conheço bem

só sei desse existir

 

mambembando em mim

sou a maior mentira

será até o fim

 


 

faquir

 

 

ai desta dor que desata

o nó da minha realidade

 

se enlaçando se acata

doer é a profundidade

 

doer de camisa de força

assinar o óbito atestado

 

quebrar, da vida, louça

guardar cacos amados

 



me amputa esta lágrima

 

de verter-te inglória

de seguir minha mão

em sua trajetória

rumo a todo, o chão

a encher-me a vista

do sal, suprema dor

ó lágrima de espólios

 

arrancai meus olhos


 
segunda parte
 

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